A ligação entre o aumento nos preços do café e a mencionada fruta tropical pode parecer inesperada. Afinal, como uma fruta pode influenciar o mercado global de café? Contudo, é exatamente isso que está ocorrendo. Em 2021, uma geada incomum devastou as plantações de café no Brasil, o maior produtor mundial.
Consequentemente, os compradores se voltaram para o Vietnã, mas a seca severa por lá também comprometeu a produção. Isso levou os agricultores vietnamitas a optarem pela lucratividade do durian, uma fruta com um mercado crescente na China, substituindo, assim, o cultivo de grãos de café. Esse contexto lança luz sobre as complexidades do comércio global e como fatores inesperados podem impactar ofertas e demanda.
Café em alta: a crise dos grãos e o Durian
Embora plantas danificadas e mudanças climáticas sejam questões amplamente compreendidas, a influência do durian no mercado de café é uma nova variável. Agricultores vietnamitas, que antes cultivavam café, estão se voltando para o durian. Essa fruta, popular na China apesar de seu odor forte, oferece uma rentabilidade significativamente maior.
A participação do Vietnã no mercado chinês de durian quase dobrou recentemente, levando os produtores a investir mais na fruta em detrimento do café. Como resultado, as exportações de café robusta do Vietnã caíram 50% em comparação ao ano anterior, esgotando os estoques. Enquanto isso, os preços do café estão agora quase nos maiores níveis já vistos nos mercados de commodities.
Além do Vietnã, outros países, como a Colômbia, Etiópia, Peru e Uganda, tentaram suprir a demanda global. Contudo, mesmo com todos esses esforços, não conseguiram atender plenamente à demanda crescente, perpetuando a crise do mercado de café.
O preço dos grãos de café, tanto arábica quanto robusta, continuou a subir, levando a uma era de café mais caro. O analista Renato Garcia Ribeiro aponta que o clima, mais do que o plantio de durian, é o principal vilão dessa situação. Eventos climáticos adversos têm afetado consistentemente as safras desde 2021, resultando em estoques reduzidos e uma pressão contínua nos preços.
Impacto econômico e as preferências dos consumidores
A questão que emerge diante dessa crise é: como isso afetará o preço do café para o consumidor final? Especialistas acreditam que o impacto pode ser significativo. Paul Armstrong, atacadista e dono da Carrara Coffee Roasters, antecipa que logo as pessoas no Reino Unido poderão pagar mais de 5 libras por um café.
Armstrong confessa ter recentemente aumentado seus preços, mas os custos continuam subindo, obrigando uma nova avaliação sobre repassar ou não esses aumentos aos clientes. Essa situação de incertezas e altas nos preços é descrita por ele como uma “tempestade perfeita”.
Além disso, Armstrong menciona que certos segmentos da indústria de café sentirão mais os efeitos que outros. Produtos mais comerciais, como café instantâneo e café vendido em supermercados, provavelmente sofrerão aumentos maiores.
Ainda assim, há esperanças de que o cafezinho de cada dia não se torne um luxo inatingível para todos, mas, sim, que os consumidores possam optar por cafés de maior qualidade à medida que a diferença de preço se estreita.
Por outro lado, Felipe Barretto Croce, CEO da FAFCoffees, sugere que, apesar do aumento dos preços, o café continua sendo relativamente acessível, especialmente quando preparado em casa. Ele destaca que a parte do custo derivada dos grãos representa menos de 10% do preço final de uma xícara. Para ele, os aumentos são impulsionados, em grande parte, por gastos inflacionários gerais, como aluguel e mão de obra.
Mudanças climáticas e o futuro do café
À medida que a primavera se aproxima no Brasil, as condições climáticas tornam-se cruciais para determinar o futuro do mercado de café. A esperança está depositada no retorno das chuvas numa janela de tempo oportuna, permitindo uma floração correta e uma safra saudável.
No entanto, atrasos podem comprometer ainda mais a produção do próximo ano, prolongando a atual pressão sobre os preços. A indústria segue atenta às políticas e aos padrões climáticos, que são determinantes para a estabilidade do café global.
Um estudo de 2022 mostrou a gravidade dos desafios que as mudanças climáticas apresentam para o cultivo de café. A área adequada para a cultura pode cair até 50% até 2050, mesmo com esforços significativos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Diante deste cenário, Croce apoia a introdução de um “prêmio verde”, uma taxação destinada a investimentos em práticas agrícolas regenerativas. Essa iniciativa visa viabilizar a sustentabilidade no cultivo de café, protegendo essa valiosa indústria contra futuras adversidades climáticas.
Enquanto os preços do café continuam a subir impulsionados, entre outras coisas, por uma fruta tropical aromática, as mudanças climáticas permanecem a maior ameaça à acessibilidade do café a longo prazo. A necessidade de ações sustentáveis e imediatas não poderia ser mais urgente.